sábado, 3 de setembro de 2016

Paralelismo semântico

         Quando se coordenam palavras, é importante que elas pertençam à mesma área de significação. Caso isso não ocorra, pode haver uma ruptura do paralelismo. Esse tipo de quebra produz muitas vezes correspondências indevidas, como neste exemplo:  
      “A diferença entre o IDH dos países pobres e os países ricos é resultado sobretudo da educação.”
      O aluno se propõe a estabelecer o contraste entre dois IDH´s (Índices de Desenvolvimento Humano). Para isso inicia um processo coordenativo em que o primeiro termo é a sigla seguida de um adjunto adnominal.  Espera-se que no segundo ele mantenha o mesmo padrão, falando do IDH dos países ricos. Como isso não ocorre, o resultado é um confronto entre elementos heterogêneos. Não se pode comparar um índice com um país.
        Outro exemplo aparece nesta passagem de uma redação sobre os desafios de quem chega à cidade grande:
       “Armadilhas, tentações, interesseiros irão lhe acompanhar aonde você queira ir.”
       Embora os três núcleos do sujeito estejam representados por substantivos (ou seja, não há quebra do paralelismo morfossintático), é visível a ruptura produzida pelo terceiro. Os dois primeiros são genéricos, remetem às ações, enquanto que o último designa o agente. Para haver harmonia semântica, o aluno deveria ter escrito “interesses” em vez de “interesseiros”.  
        Exemplo semelhante ocorre neste outro trecho:
       “A partir de então, na empresa, foi vítima do ciúme, do ressentimento, dos agressores que a invejavam.”
       Se o redator inicia a sequência de complementos com “ciúme” e “ressentimento”, é natural que a feche com uma palavra do mesmo nível semântico. Escrevendo, por exemplo, “da agressividade dos que a invejavam”.
     Às vezes a ruptura é discreta, mas nem por isso deixa de comprometer a unidade do período. Muitos talvez não percebam que ela ocorre no exemplo abaixo:  
       “O dinamismo econômico dita a capacitação profissional e os serviços mais qualificados.”
       Mas ocorre, sim. A frase ficaria mais harmoniosa caso os dois complementos fossem da mesma natureza, o que se obtém com uma pequena inversão dos termos que formam o segundo objeto direto: “O dinamismo econômico dita a capacitação profissional e a maior qualificação dos serviços.”
        A quebra do paralelismo pode ter caráter estilístico, como nesta famosa passagem de Machado de Assis:
         “Marcela amou-me durante 15 meses e 11 contos de réis".
         A menção ao dinheiro surpreende o leitor, que espera a continuidade da indicação temporal. Ao coordenar informações que não têm relação uma com a outra, o narrador enfatiza que a moça não esteve com ele por amor; agiu por interesse. Outro seria o efeito se essa confissão aparecesse em outro contexto. Seria uma referência crítica e talvez nostálgica, mas a que faltaria a nota irônica.  

                                       

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