terça-feira, 23 de outubro de 2018
Dicas de redação em versos
quarta-feira, 17 de outubro de 2018
A subjetividade no texto dissertativo
Geralmente se confunde a manifestação da subjetividade com o uso do eu. O problema não é tanto o emprego da primeira pessoa; é sobretudo a forma como o autor desenvolve o tema. A eficácia desse tipo de texto fica comprometida quando o emissor apresenta uma visão emocional e impressionista da realidade. Em vez de julgar, refletir, discutir os fatos, opta pelo achismo ou pela vagueza de expressão.
Entre os procedimentos que acentuam a subjetividade e comprometem o rigor do texto dissertativo, estão:
-- a presença de expressões como acho, penso, suponho - Esses verbos devem ser evitados por dois motivos: não trazem nenhuma informação nova e indicam
-- o uso de hipérboles - O exagero é por excelência um traço emocional. Compromete a objetividade do discurso por se constituir num juízo desmedido, que não caracteriza adequadamente pessoas, objetos e situações. Por exemplo: “A dependência da opinião dos outros é algo trágico que muda a forma de pensar.” “Em meio ao vulcão de hormônios colocados em ebulição pelo processo de crescimento, os jovens se manifestam insatisfeitos.”
-- o emprego de preciosismos - Entende-se por preciosismo o apelo a vocábulos e construções pouco usuais, com o objetivo de impressionar o leitor. É o que se chama popularmente de falar (ou escrever) difícil. As construções preciosas tendem a conceder mais importância ao enunciador do que ao enunciado. Representam um obstáculo à leitura, que se faz pela previsão gradativa das informações contidas no texto. Se uma
Exemplo de preciosismo: “Deveras questionamos o melhor tratamento que pode ser dado aos nossos filhos, o qual é fundamental ao engendro de sua personalidade”. Quem escreve isso está mais interessado em aparecer do que em dizer. Não se importa com ser ou não entendido.
-- a linguagem figurada - Deve-se em princípio evitar esse tipo de linguagem. É preferível a denotação, que favorece a transparência das ideias. Mesmo porque o uso de figuras constitui atributo mais de escritor do que de redator. Ninguém é avaliado no vestibular por sua “veia literária”, mas pela capacidade de desenvolver com clareza, coerência e coesão um tema.
Isto não significa que se devam proibir as tentativas de dar expressividade ao texto por meio de um ou outro desses recursos expressivos. É impossível escapar totalmente à figuração. O que se deve é retificar as associações impróprias e mostrar ao aluno que a “imagem” precisa ter nexo. O estudante vai acabar se convencendo de que, em vez de se aventurar por esse terreno incerto, é mais seguro usar o repertório que a denotação lhe oferece.
Escolhendo a denotação, ele será capaz de evitar “armadilhas” como estas:
- “Devemos sempre buscar as taças de aprovação saudáveis para o equilíbrio emocional.” (Aprovação não é algo que seja medido por “taças”. Por que não dizer simplesmente “níveis”?)
- “A dependência da opinião dos outros é um buraco na armadura social do indivíduo, deixando-o fraco e vulnerável para o ataque de outras pessoas.” (A ideia de que a dependência fragiliza socialmente o indivíduo tornaria o período mais claro.)
- “O meio ambiente é o cérebro do mundo, qualquer alteração na sua estrutura pode ocasionar danos que afetarão todos os seus elos.” (Os atributos de reflexão e comando, próprios do cérebro, não se aplicam ao meio ambiente.)
O valor semântico das preposições
sábado, 6 de outubro de 2018
Algoritmo da redação
O algoritmo, segundo Yuval Noah Harari, é “um conjunto metódico de passos que pode ser usado na realização de cálculos, na resolução de problemas e na tomada de decisões” (Homo Deus, Companhia das Letras, p. 91). É possível incluir nesse esquema a elaboração de textos dissertativos, que também se dá por meio de passos metódicos. Os passos de um algoritmo de redação não são novidade; constam basicamente da introdução, do desenvolvimento e da conclusão. Nosso objetivo aqui é ilustrar esses passos e apresentar algumas estratégias argumentativas.
A apresentação do tema pode se dar
por meio de contextualização histórica, citação, definição etc. Fazendo uma
analogia com a linguagem médica, ela é como uma “apresentação do caso”. Nessa parte
nada se discute nem se propõe, mas é fundamental que se apresente um
posicionamento (ponto de vista). Também é aconselhável que se incluam tópicos a
serem desenvolvidos nos parágrafos argumentativos. Por exemplo, numa redação
sobre “a depressão na adolescência”, podem-se destacar como possíveis razões “o
vício em novas tecnologias” e o “consumismo da sociedade”:
A
depressão é considerada o novo mal do século. Ela provoca tristeza, culpa, e
em casos extremos pode levar ao suicídio. Um dado preocupante é que tem
crescido sobretudo entre os jovens; incide com frequência, por exemplo, em
pessoas com 12 a 15 anos. Entre as possíveis causas para esse crescimento
estão o vício em novas tecnologias e a inserção dos adolescentes numa
sociedade que prioriza os bens materiais em detrimento das necessidades
emocionais e afetivas. |
No Desenvolvimento, procura-se demonstrar o ponto de vista com uma argumentação convincente. O que torna convincente uma argumentação? O apoio na realidade (mediante a citação de fatos, exemplos ilustrações) e a apresentação de razões. No parágrafo abaixo, acrescenta-se a esses dois procedimentos a referência a uma autoridade citada num dos textos motivadores (não se deve esquecer deles). A argumentação ganha concretude com a menção ao telefone celular e a alguns dos riscos que ele pode trazer; procura-se vincular o seu uso a manifestações do comportamento depressivo (o negativismo e a diminuição da autoestima, por exemplo):
Ressalte-se,
de início, que as novas tecnologias exercem grande fascínio sobre os jovens.
Certamente o artefato que mais os atrai é o telefone celular, devido à
multiplicidade de funções e ao fácil manuseio. Essas qualidades têm um grande
poder viciante e fazem com que o celular se constitua num substitutivo para
as relações sociais. Para piorar esse quadro, muito do que se veicula nesse
tipo de aparelho são registros de vidas glamurosas e “felizes”, o que leva à
comparação com a existência discreta do comum das pessoas. O resultado em
muitos jovens, como observa o psiquiatra Rodrigo Leite, é a diminuição da
autoestima e o cultivo de uma “visão negativa de si mesmo”. |
No parágrafo seguinte, aborda-se o segundo tópico referido na introdução (valorização do consumismo), confrontando o hábito de consumir, bastante estimulado pelo capitalismo, com a índole de indivíduos carentes de valores espirituais e, por isso mesmo, mais propensos a desenvolver depressão:
Esse quadro, além do mais, acentua-se com a atual tendência ao
consumismo. Num contexto em que a felicidade se mede pelo montante da conta
bancária e pela quantidade de bens que se consegue acumular, é natural que os
que não aspiram a esse ideal pragmático fiquem abatidos e se sintam
inferiores. Geralmente são pessoas sensíveis, emocionalmente carentes, para
as quais contam sobretudo os valores do espírito. O abandono desses valores
acentua a sensação de vazio interior, que é uma das marcas da depressão, e
pode levar a um desencanto que culmina no suicídio. |
Na Conclusão, apresentam-se propostas vinculadas ao que foi discutido no Desenvolvimento. Tais propostas devem então consistir em ações que visem à redução do vício em tecnologia e do consumismo:
Diante disso, para reduzir a incidência da depressão entre
os jovens, é preciso combater o vício em novas tecnologias (particularmente, no telefone celular) e alertá-los sobre os riscos do consumo excessivo -- tarefas que cabem sobretudo à família e à escola.
Compete aos pais incutir nos filhos o gosto pela cultura, facilitando-lhes o
acesso a livros, filmes, peças teatrais, a fim de limitar a frequência
perniciosa com que se entregam ao celular ou a artefatos semelhantes. A
escola, por sua vez, deve enfatizar a formação humanística, associando às
tarefas curriculares atividades extraclasse como debates e palestras educativas,
a fim de propiciar aos adolescentes um preenchimento espiritual que os afaste do hábito
de consumir em excesso. Conforme lembra Zygmunt Bauman, “o problema não é
consumir; é o desejo insaciável de continuar consumindo”. Seguramente não é
pela busca de satisfazer esse desejo que o depressivo vai preencher o doloroso
vazio que sente na alma. |