A coesão sequencial assegura a continuidade
lógica dos componentes textuais. Ao contrário da coesão referencial, que retoma
ou antecipa partes do texto, ela opera mediante acréscimos, correlações, uso de
conectivos ou pela simples ordenação linear. Sua quebra ocorre, entre outros
casos, quando
a) não se respeitam as correlações entre
os modos e tempos verbais (ver, sobre o assunto, matéria nossa no número 73 da
revista Língua Portuguesa);
b) não se usam adequadamente os
conectivos, como nestas passagens retiradas de redações (entre parênteses estão
as formas corretas):
- “O avanço tecnológico , além
de suas vantagens
e comodidades , traz preocupação
a todos nós” (apesar de) -
- “Não queria deixar
vovó sozinha a tão pouco tempo da morte do meu avô” (“há”, pois a preposição indica tempo futuro)
-
- “O cigarro
é uma irracionalidade , mas não podemos aplaudi-lo” (logo, por isso) -
- “O sofrimento é uma etapa
da vida em
que todos
passam por ela” (“pela qual”,
suprimindo-se o pleonástico “por ela”) -
- “Perdi meu pai e fui morar com um sacerdote ao
qual aprendi as minhas primeiras noções de latim” (com o qual) -;
c) não se observa a simetria
entre os consequentes dos pares correlativos (alguns... outros; não somente...
como também; tanto... quanto; etc.).
Por terem o mesmo
valor sintático, os consequentes desses pares devem apresentar a mesma forma. Nem
sempre os alunos observam isto, como se vê na passagem abaixo:
“Com o aumento da criminalidade no
Brasil, a população busca reagir, alguns
de maneira irracional ao tentar fazer justiça com as próprias mãos, enquanto outros acreditam que a redução da
maioridade penal contribuiria para amenizar esse quadro.”
O estudante se refere a dois grupos
populacionais que têm reações distintas ao aumento da criminalidade. Articula
essa referência por meio de uma correlação introduzida, respectivamente, por “alguns”
e “outros”. A correlação é contudo falha, pois o consequente de “alguns” aparece
como termo simples (“de maneira racional”), e o de “outros” como uma oração (“enquanto
outros acreditam que a redução da
maioridade etc. etc.”).
A falta de correlação não é somente
sintática; é também semântica. Se “alguns” reagem de maneira irracional,
espera-se que a atitude de “outros” se caracterize por alguma racionalidade; o
aluno preparou o leitor para a oposição. No entanto ele próprio contesta essa possibilidade
ao qualificar como uma “mera crença” a ideia de que a maioridade penal vá reduzir
a prática dos crimes. Se essa crença é ilusória, não constitui uma alternativa
racional; logo, o paralelo proposto não se realiza. 2
Nesta passagem de uma redação sobre a
escrita na internet, verifica-se uma quebra de simetria no uso de “não só...
como também”:
“A internet atraiu um número
significativos de adeptos por todo o mundo, tornando a escrita não só um dos principais meios de interação
como também ampliou o acesso das
pessoas a esse tipo de linguagem, mesmo que seja por meio de um teclado e não
através de um mouse.”
É fácil perceber a quebra. Após o
primeiro membro do par correlativo (não só), aparece um termo simples,
centralizado pelo sintagma “meios de interação”. Já depois do segundo (como
também), figura um enunciado oracional. O problema pode ser resolvido com o simples
deslocamento de “não só” para antes do verbo:
“A internet atraiu um número
significativos de adeptos por todo o mundo. Ela não só tornou a escrita um dos principais meios de interação, como também ampliou o acesso das
pessoas a esse tipo de linguagem, mesmo que seja por meio de um teclado e não
de um mouse.”
Rupturas na coesão sequencial não
constituem propriamente infrações gramaticais. Dizem respeito à arquitetura do
texto e interferem na legibilidade, por isso devem a todo custo ser evitadas.