Ao
escrever, deve-se em princípio fugir do óbvio. Nada irrita mais o leitor do que
se deparar com informações que ele já conhece ou pode facilmente deduzir. Elas
parece que estão no texto para “encher linguiça” e completar o número de linhas.
O óbvio está para o conteúdo assim como o clichê está
para a forma. É um lugar-comum mental. Indica pobreza de ideias mais do que de
estilo e concorre para baixar a informatividade. Dizendo o que todos já sabem, o
redator dá a entender que não tem um pensamento próprio. É uma espécie de “maria
vai com as outras” (escrito agora sem hífen, em razão dessa esdrúxula reforma
ortográfica).
São óbvias afirmações como as de que “o
Estado deve promover o bem-estar dos cidadãos”, “o capitalismo aumenta a
desigualdade social”, “o homem precisa continuamente rever os seus conceitos”
etc. etc. Informações desse tipo, de tão batidas, nada acrescentam ao que o
leitor já sabe.
Mas nem tudo no óbvio é inútil. A evidência
que ele representa pode ter valor argumentativo, ou seja, servir de reforço a
um ponto de vista. Existe um nome para esse recurso: argumento de presença. Por meio dele se realça uma verdade indiscutível,
um conceito ou ideia que as pessoas devem ou deveriam ter em mente.
Esse tipo de argumento aparece, por
exemplo, nesta passagem da redação de um aluno: “A adolescência
é uma idade de conflitos
e insegurança , por isso o adolescente
deve ser orientado em
suas escolhas ”.
O que ele afirma na primeira oração não é novidade. Psicólogos, pedagogos,
terapeutas (e os pais, pelo que experimentam em casa!) sabem que os conflitos e
a insegurança em boa medida caracterizam o universo mental dos adolescentes.
Geralmente quem formula o argumento de
presença não o faz apenas para “dizer de novo” o que já se sabe. Procura associá-lo
a outros recursos argumentativos. No exemplo que acabamos de mostrar, a verdade
enfatizada pelo estudante serve de reforço ao apelo que ele faz na segunda
oração (no sentido de que se devem orientar os indivíduos nessa faixa de idade).
Por que
precisamos trazer à tona o óbvio? Porque o ser humano comumente se alheia de princípios
que não poderia nem deveria esquecer. Isso o leva a negligenciar deveres,
distorcer valores, praticar injustiças contra si ou contra os outros. Repetir antigas
verdades é sempre uma forma de chamá-lo à razão.
Nenhum comentário:
Postar um comentário