A
preposição estabelece uma relação de subordinação entre dois termos. O segundo
termo, ou consequente, é um substantivo, um pronome ou um verbo no infinitivo.
Por exemplo: Gosto de cinema, Espero
por você, Penso em viajar. Poucos atentam para o fato de
que esses conectivos têm valor semântico. Embora sejam vocábulos relacionais,
preservam um discreto conteúdo significativo e exigem rigor no seu emprego.
Quando “se conversa com alguém”, a ideia de contato entre
os interlocutores (presente no prefixo) se confirma ou reitera no uso da preposição
“com”, que introduz o objeto indireto (Ninguém conversa “em alguém”, ou “por alguém”). O mesmo se dá com o verbo “concordar”. Já em
“discordar” o prefixo significa afastamento, que é um dos valores da preposição
“de”. Então se discorda “de alguém”
ou “de alguma coisa”.
Ninguém precisa saber etimologia para
usar bem as preposições. Basta ficar atento à regência, ou seja, ao tipo de conectivo
que os verbos transitivos indiretos “pedem” antes de seus complementos. Por vezes
mais de uma preposição é possível, por vezes não “(Luta-se com ou contra alguém”,
por exemplo).
Alguns problemas frequentes na escolha
das preposições aparecem nas passagens abaixo, retiradas de redações:
1
- “Discordo plenamente com o seu ponto de vista”
2
- “É preciso refletir em cima das
razões que levam a nossa educação a ser tão ruim.”
3
- “Nietzsche critica o fato de as pessoas basearem a autoestima de acordo com a imagem que os outros
têm de nós.”
4
- “A prova teve que
ser adiada em função do alto número de candidatos .”
5
– “Papai sempre deu valor ao estudo. Essa herança foi herdada por meu avô.”
É inadequado,
como vimos, dizer que alguém “discorda com
alguém ou alguma coisa”. Certamente o engano se deve à influência do verbo “concordar”,
cujo complemento é introduzido por essa preposição (curiosamente, ninguém diz “concordo
de alguém ou algo”).
Na construção “refletir em cima de”, em vez de “sobre”, ocorre uma tradução errônea deste
último conectivo. Ele tem entre seus sentidos o de “posição superior”, mas esse
valor só aparece quando a preposição introduz adjunto adverbial (O livro está “sobre a mesa”, ou seja, “em cima da mesa”). Não tem cabimento
estendê-lo a construções com objetos indiretos.
O verbo “basear” rege complemento com a
preposição “em”. Assim, baseia-se a autoestima “na imagem” (e não “de acordo
com a imagem”) que os outros têm de nós. Semelhantemente, é inadequado trocar “em razão
de” por “em função de”. A primeira locução tem valor causal, por isto se ajusta
melhor à frase do aluno (a prova foi adiada por causa do alto número de candidatos). A segunda, que significa
“na dependência de”, seria pertinente numa construção do tipo “Ele vive em função do dinheiro dos pais.”
No último exemplo, o uso da preposição “por”
(e não “de”) sugere que o hábito do estudo se transmitiu, hereditariamente, do
pai ao avô! Isso mostra que o emprego indevido das preposições não apenas infringe
a norma culta. Também pode afetar a coerência. Usar corretamente esses e outros
conectivos (como as conjunções e os pronomes relativos) concorre para conferir
unidade ao texto. Ou, como diz Umberto Eco, para lhe dar “beleza lógica”.
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