Mais uma vez o tema de redação do Enem
surpreende. “Caminhos para combater a intolerância religiosa no Brasil” não é bem
o que os professores e os alunos esperavam. As apostas se concentravam em crise
econômica, justiça com as próprias mãos, problemas de mobilidade urbana, políticas
de educação inclusiva ou novo papel dos idosos numa sociedade da qual
participam cada vez mais.
A surpresa, porém, não vai gerar
protestos dos alunos. O tema escolhido permeia discussões que, de algum modo,
fazem parte do seu cotidiano. Além do mais, correlaciona-se com outros frequentemente
trabalhados em classe, como o do preconceito contra as minorias e o da aversão
ao que é diferente. É dentro desse espectro de ódio e rejeição que se inclui a intolerância
religiosa, e muitas das medidas apontadas para debelar o preconceito contra as
diferenças servem para combatê-la (o que já é uma boa pista para as propostas
de intervenção).
Os que criticarem o tema o farão pelo que
presumivelmente há nele de subjetivo e, digamos, dogmático. Religião, afinal de
contas, pertence ao foro íntimo de cada um. Essa crítica contudo não procede,
pois a banca teve o cuidado de evitar qualquer discussão quanto a esse ponto ao
reconhecer de antemão que a intolerância existe. Ou seja: o tema não é a intolerância
(se há ou não), mas sim os meios de se opor a ela. Assim, os que professam seus
diferentes credos não têm motivos para defendê-los por se sentirem rechaçados,
ou mesmo discriminados, de modo que argumentar neste sentido seria afastar-se
do tema.
A despeito do adjetivo “religiosa”, não
existe no tema nenhuma conotação metafísica ou nenhum apelo a que o candidato defenda sua religião. Tampouco os que não creem estão convocados a explicar os
motivos da descrença. O tema remete, na verdade, a valores racionais e éticos
ao postular o respeito à igualdade e a crítica à discriminação. Ao mesmo tempo
salvaguarda a laicidade do Estado, que como guardião constitucional deve
defender o direito de todos a professar suas crenças.
O
candidato deve ter cuidado para não cair numa das armadilhas citadas acima e,
com isso, afastar-se do foco temático. Como escapar disso? Primeiro, detendo-se
nas causas da intolerância religiosa (históricas, sociais, intelectuais); não há
dúvida de que as duas primeiras concorrem para que determinadas religiões, como
as de origem africana, sejam discriminadas. Segundo, fazendo o que a banca
pede, ou seja, indicando os caminhos para combater a intolerância. Eles passam,
obviamente, pela atuação de instituições como a família e a escola, assim como
pela ação rigorosa das instâncias responsáveis por punir os transgressores.
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