Não é novidade que só se aprende a escrever com leitura e muita prática. A leitura fornece modelos de raciocínio, estruturação sintática e escolhas semânticas. A prática leva ao gradativo ajuste do pensamento à expressão. Como diz Clarice Lispector, “para escrever, o único estudo é mesmo escrever”. Esse princípio também se aplica à produção textual em sala de aula.
É um trabalho que pede repetição e
continuidade; os alunos devem redigir com frequência (produzir, no mínimo, uma
redação por semana) e refazer os próprios textos. Sem refeitura não há
progresso. Nenhum texto ganha forma na primeira vez em que as palavras são
lançadas no papel. Reescreve-se para chegar ao que se quer dizer. A reescrita
desenvolve o senso crítico e ensina muito sobre as possibilidades da língua.
Para Eliane Donaio Ruiz, o professor deve
incorporar ao ensino essa prática “absolutamente comum entre os escritores
(...), seja simultaneamente ao ato da escrita, seja posteriormente a ele”
(“Como corrigir redações na escola”, Contexto, p. 24). Se ela não acontece, a
correção se limita à exposição dos problemas, sem que o aluno seja convocado a
compreendê-los e os resolver. A refeitura faz com que ele se fixe não apenas no
resultado, mas também nas transformações que deve efetuar. Isso o ajuda a
perceber que a escrita é um processo.
Escrever primeiras versões ruins é
condição para que, posteriormente, se chegue a um resultado satisfatório. Quem
não aprender a reconhecer as falhas – suas e dos outros – não terá como as
evitar. A correção só se completa quando o estudante, consciente dos deslizes
que cometeu, é capaz de repará-los numa segunda ou mesmo numa terceira versão.
Os alunos com o tempo se convencem disso e passam a temer menos os erros, pois
sabem que eles são um ponto de partida para o acerto. Ao reescrever, aprendem a
desconfiar do binômio “certo/errado”, “bom/mau”. Convencem-se de que toda
redação pode ser aperfeiçoada; o precário material que produzem nas primeiras
versões é a matéria-prima que resultará em bons textos.
Segundo Daniel Cassany, escrever “é como
atirar pedras – a gente não sabe com certeza os efeitos que causará quando a
pedra sair da mão.” (“Oficina de textos”, Artmed, p. 91). A reescrita ajuda a
conhecer a trajetória da pedra, evitando o risco de que ela caia na cabeça de
quem a jogou. Uma das melhores justificativas para refazer o texto está no
exemplo dos escritores; eles reescrevem para aperfeiçoar o estilo, descobrir o
foco no qual melhor se desenvolve uma narrativa ou justificar com argumentos
verossímeis as reações dos personagens – entre outras finalidades.
Em sala de aula não se procede a uma
reescrita literária, mas a uma reelaboração que busca aprimorar o texto segundo
parâmetros gerais (os que determinam o estilo são particulares). O princípio
que orienta as duas atividades, no entanto, é o mesmo – o de que na prática
consciente e contínua está a chave para o bom uso da linguagem.
Reescrever não é revisar. Por meio da
revisão corrigem-se tropeços na ortografia, na regência, na concordância, na
sintaxe dos modos e tempos do verbo. A reescrita vai além: implica mudar ou
cortar palavras, reordenar períodos, dar nova disposição aos parágrafos, a fim
de que o texto atinja os objetivos a que se propõe. A refeitura visa aprimorar
a competência discursiva do aluno. Não escreve bem apenas quem não comete erros
ortográficos e se sai bem em concordância e regência. Um texto pode ser correto
nesses aspectos e não cumprir a sua função. O estudo da norma só tem sentido se
conduz à produção de textos, sobretudo escritos, que também ajudem o indivíduo
a atuar na sociedade. Quem não tem voz não tem vez.